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Cristo, Nosso Tudo (1935)

por T. Austin-Sparks

Capítulo 1 - A Cruz de Cristo, a Base de uma Nova Criação

” E aquele que está assentado no trono disse: Eis que faço novas todas as coisas.” Apocalipse 21:5.

"...para que dois criasse, em si mesmo, um novo homem... " Efésios 2:15-16.

"Se alguém está em Cristo, é nova criatura. " 2 Coríntios 5:14-17.

"...o seu cadáver não permanecerá no madeiro durante a noite... porquanto o que for pendurado no madeiro é maldito de Deus; assim, não contaminarás a terra que o Senhor, teu Deus, te dá em herança." Deuteronômio 21:23.

" ...ao qual também tiraram a vida, pendurando-o no madeiro." Atos 10:39.

"Cristo... fazendo-se ele próprio maldição maldição em nosso lugar.” Gálatas 3:13.

"…do Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo." Apocalipse 13:8.

"...a glória que eu tive junto de ti, antes que houvesse mundo." João 17:5.

"...pelo sangue da eterna aliança." Hebreus 13:20-21.


Todas essas passagens têm uma relação entre si e estão ligadas à palavra: "Eis que faço novas todas as coisas". Vemos nela o plano de Deus em três fases principais.

A primeira fase está relacionada à presciência de Deus. Algumas das passagens que lemos referem-se a algo que aconteceu "antes da fundação do mundo”. Jesus disse que tinha glória com o Pai "antes que houvesse mundo". O Cordeiro havia sido morto “desde a fundação do mundo".

Deus viu, em Sua presciência, a necessidade de uma obra redentora e lançou as bases para uma nova criação. Ele viu o fim da redenção em sua consumação — cumprida por meio da cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, que foi morto, segundo o propósito de Deus, desde a fundação do mundo; isto é, antes que as bases da nova criação fossem lançadas.

Em Hebreus 13, lemos sobre o sangue de "uma eterna aliança". Isso não se refere a uma eternidade "futura". Essa palavra aponta para o passado, um passado visto do nosso ponto de vista; porque para Deus o passado e o futuro são semelhantes: um tempo presente eterno. Mas a Palavra, sendo escrita por nós, e levando em conta nossa esfera limitada, quer nos mostrar que, na presciência de Deus, o sangue de uma aliança eterna já estava consagrado. Então, esta criação veio à existência. Ela surgiu do estado caótico de um mundo julgado, e "era muito boa". Depois disso, veio a queda. Através do pecado, o maligno prevaleceu e fez com que a história do mundo se tornasse uma história de trevas e miséria humana. Agora, a criação aguarda a redenção — "a revelação dos filhos de Deus".

Isso nos leva à segunda fase do propósito de Deus, a Cruz do Filho do Homem. Nele surge, ao mesmo tempo, a nova criação. Por um lado, a velha criação foi julgada e chegou definitivamente ao fim nEle como nosso Representante. Na morte de nosso Senhor Jesus Cristo, todos morreram. Por outro lado, Ele é a ressurreição e a vida, “o primogênito dentre os mortos". Mas esta nova criação não é como a antiga. O novo céu e a nova terra são de uma ordem diferente. Agora vivemos "pela fé e não pelo que vemos". É um mundo espiritual, inteiramente novo; novo num sentido abrangente. 

A terceira fase nos é apresentada no livro do Apocalipse, capítulo 21: "Eis que faço novas todas as coisas". Essa é a nova criação em sua consumação. É uma criação espiritual como o resultado final da Cruz de Cristo. Essa criação espiritual assumirá uma forma adequada à sua natureza: um novo céu e uma nova terra.

Essas três fases do plano divino estão muito claras na Palavra de Deus. Mas voltemos agora ao ponto central, a saber, o fato de que é a Cruz que está na base de todas as coisas se tornarem novas.

A cruz tem dois lados. Ela representa o fim de uma velha criação e o surgimento de uma nova.

Vamos agora ver o ponto de onde Deus inicia Sua nova obra? Bem, houve um momento na cruz do nosso Senhor Jesus Cristo em que toda a criação estava, por assim dizer, em ruína. Espiritualmente, encontramos o que nos é dito no início do livro de Gênesis a respeito do estado da Terra. Lemos: "A terra, porém, estava sem forma e vazia; havia trevas sobre a face do abismo." [Gn 1:2] Isso foi o resultado de uma queda. Significou julgamento. Quando chegamos à cruz de nosso Senhor Jesus Cristo e vemos novamente as trevas sobre a Terra que duraram até a nona hora, e O ouvimos clamar: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?" [Mt 27:46], entendemos o que Ele quis dizer quando declarou: "Chegou o momento de ser julgado este mundo" [João 12:31 ]. No Filho do Homem, Deus cololcou a criação em seu estado decaído e toda a obra do diabo debaixb do Seu julgamento. Deus a abandonou e rejeitou em seu Representante. Esse terrível julgamento caiu sobre uma pessoa. Um homem se tornou o representante de todos.

Jesus Cristo na cruz representa toda a criação debaixo do julgamento de Deus. Deus estava visitando nEle o pecado do mundo inteiro. Toda a criação caiu na morte. Deus cortou a própria luz do Seu rosto de Seu Filho. Todo o pecado desta criação, perscrutado através do coração de um homem. A resposta ao Seu clamor: "Por que me desamparaste?" seria, na verdade: "Por causa do pecado do mundo que está sobre Ti. Por causa da obra do diabo, que deve ser destruída.” O apóstolo Paulo diz: "um morreu por todos; logo, todos morreram." [2Co 5:14]. Sabemos que em Sua cruz o mundo inteiro é lançado fora. "As coisas velhas já passaram."

Mas temos que perceber isso em nossa consciência; precisamos ver isso. A mente natural não compreende isso. A sabedoria natural é, segundo Tiago, inspirada pelo diabo. Vemos uma sabedoria diabólica em ação hoje. Somente se Deus nos conceder luz, poderemos ver as coisas à Sua luz. Então, veremos o que o homem natural realmente é. Vemos a cruz como a revelação da ira de Deus sobre nossa natureza pecaminosa. A cruz do Calvário é o julgamento sobre este mundo pecaminoso. E porque pertencemos, por natureza, a este mundo que Deus abandonou, a cruz de Jesus Cristo deve ser registrada em nossas vidas; para que o que somos por natureza esteja sob o julgamento da cruz. Temos que nos repudiar continuamente para que nossa vida não fique debaixo da ira de Deus. Não ousamos servir a Deus com aquilo que Ele rejeitou. Deus rejeitou a sabedoria do homem e Ele não a terá em Seu serviço, nem terá quaisquer outras "habilidades" que provém de nós mesmos. Deus só pode usar aquilo que vem diretamente da nova criação.

Portanto, precisamos ser muito cuidadosos. Há uma necessidade constante de exame de consciência neste assunto. Com que facilidade algo do homem natural se insinua. Repetidamente, queremos servir e fazer coisas – com as nossas melhores intenções – onde não podemos nem devemos fazer nada, onde Deus tem que estar fazendo tudo em nós, onde tem que ser na força de uma nova vida para trazer um novo ministério. É preciso nos mantermos muito próximos da Cruz de Cristo. O Espírito Santo deve ter permissão para manter este homem natural na Cruz, para que todas as coisas possam verdadeiramente "provir de Deus", e não de nós mesmos.

Não é terrível que possamos estar debaixo de julgamento mesmo na obra de Deus? É impossível viver uma vida aceitável diante de Deus usando recursos que estão debaixo de Sua maldição, com aquilo que produzimos, na força de nossa capacidade. No livro de Deuteronômio, lemos que o corpo daquele que está pendurado no madeiro "não permanecerá no madeiro durante a noite... porquanto o que for pendurado no madeiro é maldito de Deus". Na carta aos Gálatas, Paulo interpreta essa palavra ao falar de Cristo, "que se fez maldição por nós". Alguém pendurado no madeiro durante a noite poluiria toda a terra. Nosso Senhor Jesus Cristo, como Representante de toda a criação, poluiria toda a terra se permanecesse a noite toda na cruz! Não pode haver pensamento mais terrível na Palavra de Deus. Como isso nos revela a terrível condição desta criação que foi abandonada por Deus. Ela é tão amaldiçoada que tudo da velha natureza, sem nenhuma reserva, é deixado, rejeitado e posto de lado nAquele que, como seu Representante, se tornou uma maldição para todos.

Se alguma vez vimos a necessidade de uma nova criação, uma criação absolutamente nova, nós a vemos aqui. Tudo deve se tornar novo. A Palavra de Deus diz: "Eis que faço novas todas as coisas! Deus ressuscitou Jesus Cristo dentre os mortos". Novamente chegamos ao livro de Gênesis. "A terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo". E Deus disse: "Ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai!" Deus ressuscitou Seu Filho dentre os mortos. Ele O trouxe de volta como "o primogênito dentre os mortos". É uma nova criação que está ressuscitando. Em Cristo, nós também somos uma nova criação. É verdade, sem dúvida: "Todas as coisas são novas".

“Ora, tudo provém de Deus” [2Co 5:18]. Todas as coisas se fizeram novas. Nossa sabedoria é uma nova sabedoria. Nossa força é uma nova força. Nosso coração é um novo coração. Nossas capacidades são novas capacidades. Todas as coisas se fizeram novas. É Cristo em nós !

Percebo de uma nova maneira que precisamos ser muito diligentes para garantir que não façamos nada por nossas próprias forças, que Deus esteja fazendo tudo. Olhando para o trabalho da minha própria mente, vejo meus pensamentos, a força dos meus desejos, as fortes paixões do coração e da vontade. Mas peço ao Senhor que me sustente em temor de mim mesmo, pois toda esta criação, tudo o que sou em Adão, está amaldiçoado. Está onde Deus o abandonou e Ele não pode usá-lo. Tudo agora deve ser de Deus.

Quero exortá-lo a refletir mais sobre este assunto. Oh, existe uma nova criação maravilhosa com recursos divinos! Existem possibilidades maravilhosas, porque são possibilidades de Deus para nós. Todas as coisas são possíveis da parte de Deus. Não deveríamos tomar o lugar onde todas as coisas são possíveis? Podemos estar lá onde todas as coisas provém de Deus. ELE está iniciando as coisas, ELE está fazendo tudo. Vamos nos esforçar para entrar em nosso lugar designado por Deus em Cristo — a plenitude de Deus nEle. Portanto, temos que chegar à cruz e aceitar suas implicações de ambos os lados. Devemos ver esse lado terrível da cruz de Jesus Cristo — a maldição da cruz — que Ele foi crucificado por nós, e nós nEle. Não ousamos trazer nada daquela velha criação para a nova vida, pois ela estaria continuamente sob o julgamento de Deus. Pode chegar o dia em que todo o nosso trabalho terá que ser queimado. Há uma grande diferença entre o que é feito para o Senhor e o que é do Senhor em nós. “O que for pendurado no madeiro é maldito de Deus”. Com Cristo, fomos pendurados no madeiro, e Deus nos abandonou em Sua cruz. Mas isso não é o fim de tudo, mas o começo de algo muito maior, algo completamente novo. Deixe-me repetir: não podemos entrar no novo a menos que as coisas velhas tenham passado. "Eis que faço novas todas as coisas!"

Que o Senhor nos leve a um lugar onde se possa dizer verdadeiramente de nós: Todas as coisas são novas! E que Ele nos estabeleça nisso a cada momento. Que a Cruz seja registrada em todas as esferas de nossas vidas, atuando em nosso espírito, alma e corpo, em nossa mente, coração e vontade. Que ela opere em nossas palavras e obras, para que tudo seja governado por Sua Cruz, e um caminho claro seja aberto para a glória de Deus e a plenitude de nosso Senhor Jesus Cristo.

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