Austin-Sparks.net

Cristo, Nosso Tudo (1935)

por T. Austin-Sparks

Capítulo 10 - A Força Secreta do Propósito Divino

Quando esteve na Terra, o Senhor Jesus viveu continuamente no céu. Ele nunca tomou as coisas como certas, mas manteve uma vida baseada na fé. Ele triunfou sobre as situações aqui na Terra no poder da fé e pela oração. A oração ocupou um lugar de destaque em Sua vida. Ele continuamente extraía de Seus recursos celestiais a força e os meios necessários para realizar Sua obra para a glória do Pai. Era uma atividade de fé em relação ao Seu Pai, e era necessária para Ele. Quanto mais devemos viver nesta base de fé e oração em união com Ele!

Agora vamos considerar o último desses recursos secretos de Cristo: a força de um propósito divino.

O Senhor Jesus estava ciente de que estava vinculado a um propósito eterno e universal. Em Mateus 16:18, lemos que Ele disse, em vista desse propósito: “Edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela." Vamos entender a força e o significado dessa afirmação.

O Senhor Jesus sabia que estava a caminho da cruz. Imediatamente após a grande declaração de Pedro a respeito de Cristo como o Filho do Deus vivo, o Senhor Jesus começou a falar aos Seus discípulos sobre a cruz, mostrando-lhes que Ele deveria ir a Jerusalém e sofrer. Diante disso, temos aquela declaração deliberada do Senhor: "Edificarei a minha igreja". Isso mostra claramente que o propósito da vida de Cristo não poderia ser derrotado pela morte. A cruz não poderia destruí-la. Ele disse, com efeito: "Vou ser crucificado, mas vim para edificar a minha igreja, e a edificarei. O propósito para o qual vim não pode ser intempedido; a cruz não pode interferir nele”. Aqui vemos um propósito definido que caracterizou a Sua vida e que era mais poderoso que a morte. Sim, Ele até acrescentou: "e as portas do inferno não prevalecerão contra ela". Todas as forças das trevas não podem impedir o propósito da Sua vida, pois está ligado à eternidade, a um poder que a morte e o inferno não podem resistir.

Notemos as marcas enfáticas desse propósito nas seguintes passagens das Escrituras:

"A minha comida consiste em fazer a vontade daquele que me enviou e realizar a sua obra." (João 4:34).

" ...O Pai que o enviou... quem ouve… crê naquele que me enviou." (João 5:23-24).

" ...Que me enviou... o Pai, que me enviou…” (João 5:30,37).


Temos outros versículos que expressam de forma semelhante esse propósito definido, como:

"Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância." (João 10:10)

"O Filho do Homem veio buscar e salvar o perdido." (Lc 19:10)


Em todas essas referências, reconhecemos uma missão especial. Por trás da vinda do Senhor Jesus a este mundo, vemos um propósito definido e predeterminado. Ele não veio apenas para algum empreendimento isolado ou expedição. Ele não estava iniciando um movimento. Tudo em Sua vida estava relacionado a um propósito divino. Havia um plano definido nos conselhos eternos de Deus "antes da fundação do mundo”, que o Senhor Jesus veio cumprir. É por isso que esse propósito não poderia ser frustrado. Nem mesmo as portas do inferno prevaleceriam contra ele.

Na vida do Senhor Jesus, nada que acontecia era meramente incidental. Tudo tinha um propósito definido. Por isso, o profeta Isaías O chamou de "servo do Senhor". Quantas vezes o Senhor Jesus disse, a respeito de Sua missão: "É necessário". Há algo de imperativo em Suas palavras: "É necessário que façamos as obras daquele que me enviou” [Jo 9:4]. Isso fala de uma ausência total de indefinição.

O Evangelho segundo Marcos caracteriza-se pela precisão, mostrando o Senhor Jesus como o Servo do Senhor. A palavra peculiar a Marcos é "imediatamente". Ela ocorre cerca de quarenta vezes nesse Evangelho, mostrando como o servo deve ser. Se estamos aqui para o Senhor e Seu serviço, não temos tempo a perder. Todo o nosso coração deve ser devotado a Ele, e nossa vida marcada por um propósito em obediência a Ele. Nossa atitude, em relação ao Senhor, deve ser sempre "imediata".

O Senhor Jesus extraiu muita força desse conhecimento do propósito para da Sua vida. Não há dúvida de que nós também obteremos força desse senso de propósito, dessa consciência de nossa vocação divina. É por isso que o inimigo sempre tenta nos desencorajar. Ele busca suscitar questionamentos e dúvidas em nossos corações quanto ao atingimento do alvo, dizendo-nos que nosso trabalho é em vão. Se ele conseguir nos roubar esse senso de propósito em nossa vida, nos fazer duvidar do nosso testemunho, do nosso trabalho ou do valor do sofrimento que temos que enfrentar, perderemos nossa força e o inimigo assumirá o controle.

Jesus Cristo foi mantido na força de Deus durante todo o caminho, porque foi dominado pelo senso de Sua missão, porque manteve firme Seu propósito. Se nos apegarmos firmemente ao propósito de nossa vida, se mantivermos em vista nosso chamado celestial, também seremos mantidos fortes. Mas se tentarmos realizar alguma ambição própria, se executarmos nossos próprios projetos, se mantivermos algum movimento em andamento, não haverá recursos divinos disponíveis para nós. Para sermos mantidos fortes, é essencial que saibamos que estamos no propósito de Deus. Nosso serviço deve ser sempre o resultado de um propósito divino. É da maior importância que percebamos que temos um lugar no plano de Deus. Temos que negar a nós mesmos. No propósito de Deus não há espaço para interesses pessoais. “Daqueles que amam a Deus", para aqueles cujo coração está ocupado com Deus e com o cumprimento de Seu propósito, "todas as coisas cooperam para o bem… daqueles que são chamados segundo o seu propósito" [Rm 8:28]. Esta é uma declaração definitiva que mostra que os crentes são chamados para um propósito divino. Temos que saber tão definitivamente quanto o Senhor Jesus sabia, que estamos no propósito de Deus.

Paulo fala repetidamente em suas cartas daqueles que são chamados "segundo o Seu propósito". Em Efésios 3:10-11, temos uma destas declarações definitivas: "para que, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus seja conhecida, agora, dos principados e potestades nos lugares celestiais, segundo o eterno propósito". Podemos pensar nisso no futuro, mas o texto diz claramente "agora". Deus está fazendo algo agora em Sua igreja que é ensinar principados e potestades. Estamos cercados por inteligências invisíveis que observam os tratos de Deus conosco. Elas observam as experiências pelas quais temos que passar e que estão ligadas ao propósito eterno de Deus. Qual é esse propósito? É que sejamos conformados à imagem de Seu Filho. Em Jeremias 18:2-3, lemos: “Dispõe-te, e desce à casa do oleiro, e lá ouvirás as minhas palavras... e eis que ele estava entregue à sua obra sobre as rodas". Principados e potestades, por assim dizer, desceram à casa do oleiro e observam. O que é esse vaso nas mãos do oleiro? É a igreja. Mas o Oleiro celestial não está satisfeito com o Seu vaso. Ele precisa quebrá-lo e formar um novo. Agora o barro está na roda, e deve haver todo o tipo de trato e obra divina, e essas inteligências invisíveis estão observando como o Oleiro celestial está nos formando. Nós somos esse barro, e às vezes sentimos a pressão das mãos do Oleiro e os cortes, enquanto Ele molda a Sua igreja. Mas todas as nossas provações e sofrimentos, todas as nossas perplexidades são apenas o caminho de Deus para nos levar ao objetivo. Todos os Seus tratos têm um efeito e produzem uma mudança em nós. E as inteligências superiores veem isso e se maravilham com a sabedoria de Deus de como Cristo está cada vez mais sendo formado em nós.

Esse é o nosso chamado. Enquanto estivermos alinhados com o propósito de Deus, Sua obra pode continuar sendo realizada em nossa vida. O que importa não é, antes de tudo, a nossa atividade. Deus está mais preocupado com o que é feito em nós do que com o que fazemos por Ele. Ele frequentemente alcança Seu objetivo conosco muito melhor quando estamos em um estado de inatividade do que em tempos de muito trabalho. A mão do Oleiro estava sobre Moisés quando ele estava no deserto, onde não podia fazer muita coisa. Durante quarenta anos, ele esteve apenas cuidando de algumas ovelhas. Isso não é grande coisa. Sem dúvida, ele às vezes se perguntava o propósito de estar ali, se sua vida tinha algum valor. Mas principados e potestades viram algo e se maravilharam com a sabedoria de Deus. Deus sabia como equipar este homem, como conseguir o que queria naquela vida. Isso é verdade no caso de muitos servos de Deus. Deus está trabalhando para o bem, Ele está moldando Seu vaso. Há sabedoria em todos os Seus tratos conosco. Mas temos que cuidar para que não tenhamos planos ou ambições pessoais. O barro tem que estar completamente em Suas mãos. Se estivermos realmente aqui por Deus, podemos ter certeza de que Ele alcançará o Seu objetivo, que Ele realizará o Seu propósito em nós. E aí encontraremos força.

Você tem certeza de que está no grande propósito de Deus? Todos têm alguma participação nele. Paulo, ao falar da igreja, ilustra-a assim: "Todo o corpo, bem ajustado e consolidado pelo auxílio de toda junta" [Ef 4:16]. Nenhuma parte do corpo está sem função. Cada uma delas precisa estar no propósito de Deus. Algumas partes podem ser muito pequenas, mas são igualmente importantes. Precisamos lembrar que Deus nos chamou para um propósito que será realizado à medida que nos entregarmos a Ele. Seja qual for o propósito para o qual Ele nos chamou, estejamos prontos e o cumpramos. Uma vida possuída pelo Espírito Santo é sempre marcada por um propósito. Nada pode ser perdido nessa vida; não acreditemos que as coisas acontecem por acaso. Isso não bastará. Existe algo claro no propósito de Deus para nossas vidas. Abandonemos todos os desejos pessoais e sejamos cheios do Espírito de urgência — "imediatamente". Aqueles que sabem que são chamados por Deus e que reconhecem definitivamente o propósito de suas vidas se entregarão totalmente a ele. Tais pessoas não têm mais interesse pelas coisas terrenas. Não têm tempo a perder. Precisam comprar seu tempo.

Nossa vida agora está ligada ao nosso Senhor Jesus Cristo na glória. O propósito eterno de Deus reina sobre nós com dimensões universais, e é tão vasto quanto o domínio dos principados e potestades nos céus. A igreja de Jesus Cristo é incumbida de um plano tremendo e insondável de Deus. Saber disso significa força. Esse conhecimento nos sustenta calmos em tempos de perplexidade e provação quando Deus está executando Seu plano, como também nos enche daquela paz e alegria que – como disse o Senhor – o mundo não pode tirar de nós.

Estamos no grande propósito de Deus, fomos chamados com um chamamento celestial. Não há nada de incidental em nossas vidas. Nosso tempo é determinado por Deus. Estamos nos compromissos de Deus. Seu propósito ainda não está completo. A vinda de Cristo a esta Terra foi apenas o primeiro estágio dele, mas, visto que Cristo está no céu, há agora uma realização mais plena de Seu propósito em relação à igreja. Portanto, reconheçamos em todas as coisas a vontade de nosso Pai celestial, depositando nossa confiança nEle, e olhemos para o alvo em Espírito, crendo que o alcançaremos por Sua graça.

Em consonância com o desejo de T. Austin-Sparks de que aquilo que foi recebido de graça seja dado de graça, seus escritos não possuem copirraite. Portanto, você está livre para usá-los como desejar. Contudo, nós solicitamos que, se você desejar compartilhar escritos deste site com outros, por favor ofereça-os livremente - livres de mudanças, livres de custos e livres de direitos autorais.